sexta-feira, 5 de junho de 2009

As Memórias do Livro - Geraldine Brooks



Este livro de Geraldine Brooks, tem uma idéia muito interessante, um Hagadá do século XV reaparece em Sarajevo logo após o fim da guerra civil, em 1996. O Hagadá estava desaparecido desde o início da guerra, e acreditava-se que havia se tornado cinzas nas trincheiras bósnias. Mas para surpresa geral, fora salvo por um mulçumano, apesar do Hagadá ser um texto judaico.

O Hagadá então vai para as mãos de uma experiente restauradora para que ela o conserve e tente descobrir o que foi a vida deste livro. Ou seja, é a história da história de um livro, quase um CSI da literatura e da história. Através de fragmentos de pigmentação, asas de insetos, fios de cabelo, manchas de vinho, a heroína (Hanna) tenta refazer a trajetória do livro ao longo dos séculos, das guerras, inquisições, progroms, misérias, e etc. Com isso vamos aprendendo um pouco sobre momentos da história, costumes, tradições, etc.

A idéia é muito excitante, a execução deixa um pouco a desejar. Numa linguagem mais simples e direta não surpreende, os personagens são um tanto o quanto simplificados (os judeus todos cultos, os cristãos tolos ou intolerantes, os comunistas escrotos, os mulçumanos amigos dos judeus). Nada contra a defesa da cultura judaica, tão importante para o nosso mundo, tão vasta e bela, mas isso não precisa ser feito em detrimento de outras culturas, nem simplificando as características dos personagens, pra exemplificar: quando se descreve a perseguição aos judeus na Sarajevo da segunda guerra mundial, se justifica o apoio mulçumano, dizendo-se que foram somente uma minoria que participou, e por outro lado, os relatos do pós-guerra, (ou antes, nos relatos dos partisans de Tito) caracteriza-se os comunistas como despóticos, insensíveis à cultura e até mesmo a vida humana.

Os contos suplementares, que ilustram pelo que passou o manuscrito são bem inferiores ao mistério proposto. Mas vale a pena, leitura fácil e agradável.

É uma obra de amor à literatura, à história, à cultura, à ciência e ao saber. É um protesto contra a intolerância, a guerra, os preconceitos e à tirania. Nos lembra o valor que o conhecimento humano tem, assim como o próprio ser humano em suas vastas emoções e sua capacidade criativa, com seu compromisso em preservar sua história. Nos lembra quantos sacrificaram suas vidas pra proteger pergaminhos, papiros, fragmentos, livros ou o que seja. Nos lembra o perigo em se pregar a queima de livros, que nada mais são que depositários de todo o saber e culturas humanas. Alô diplomacia brasileira!!!



Hoje em dia, quando o anúncio da nova geração de leitores digitais aflige aos apaixonados pela literatura, creio que devemos ter em mente que os livros nem sempre existiram, havia outros suportes antes que deram lugar ao livro. Ser contra o leitor digital hoje, me soa como alguém, ao tomar conhecimento de Gutenberg, dissesse: Nada, nunca, vai substituir um bom copista! Já vimos esta história antes, quando o computador chegou e mostrou que veio pra ficar, alguns defendiam o prazer de se produzir nas máquinas de escrever. Os mesmos que hoje utilizam o computador avidamente.

Em tempo: A Ediouro poderia ter feito uma revisão melhor da tradução. Há muitos erros, pelo menos na minha edição.




@cajuínas

2 comentários:

  1. Adorei a resenha, não li o livro, fiquei muito interessado, mas cabe a pergunta: e quem consegue em um romance não esteriotipar essas diversas cilturas?!

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  2. Acho boa esta colocação: Como não esteorotipar culutras, personagens, se dento de uma obra elas surgem com o intuito de preencher certos aspectos arqeutípicos, ou da trama, ou até mesmo da ideologia da obra? Fica aqui a pergunta pra quem quiser debater. É uma questão, ao meu ver, complexa. Um presonagem - e as culturas no livro são representadas por personagens- vive numa obra, por conta da necessidade que ele desempenha. Ou seja, quanto menos importante na trama, maiores as chances de cair em estereótipos, pois ele tem um objetivo. Quero pensar mais no assunto e retrazê-lo em outro aritgo. Aceito idéias. Mas já coloco uma provocação: mais vale que o personagem sirva à trama, ou que a trama se desdobre ao personagem?

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