segunda-feira, 25 de maio de 2009

Budapeste, pra quem não leu o livro, nem esteve na Hungria.



Budapeste (dir. Walter Carvalho) é um filme que vive, assim como seu personagem principal (José Costa, ou Zsoze Kósta, sua versão hungara - Leonardo Medeiros) uma dualidade. O filme vive entre a perigosa linha fronteiriça da linguagem épica (literatura) e dramática (do cinema ou teatro). A linguagem épica vive no tempo do pretérito (passado) enquanto a dramática no presente, além do que a construção da linguagem épica se dá através do narrador, ja a cinematográica, se dá através das cenas vividas pelos persongens. Portanto, quando o filme começa com uma locução ao fundo, há uma interferência de linguagens complicada. Ainda mais que a mixagem sonora, colocou a voz em canal mono, saindo de todas as caixas de som (direita e esquerda) criando ainda mais a sensação da chamada "voz de Deus", ou seja, uma voz totalmente destacada do filme, ou do universo de vivência da história.

Esta confusão se faz ainda presente na atuação da fase brasileira do filme (
não tenho como analizar a interpretação em húngaro), os atores quase declamam, e estão um tom um pouco acima, tanto na respiração, quanto na na decupagem das falas. O filme traz a impressão de que foi feito numa outra época do cinema brasileiro, nada contra, afinal ver a Geovanna Antonelli, Débora Nascimento ou a Paola de Oliveira nuas, é de marcar o coração. Mais outra dualidade que o filme vive está entre contar a história proposta ou fazer homenagens a filmes e cineastas. A homenagem dentro de um filme pode levar o espectador a lembrar do objeto homegeado e esquecer por instantes a trama que vem seguindo. O mesmo se dá quando Chico Buarque aparece, pra nós brasileiros é um prazer poder vê-lo, mas também gera o ruído da lembrança de que ele é o Chico, e não um personagem da trama.

A sonorização do filme tem altos e baixos, mas no geral deixa a desejar, a direção musical beira o melodramático. A mixagem sonora perde em cenas como a do grupo de samba na praia. A cena em si já é esquisita, mal construida, com os figurantes perdidos em cena, e a sonorização não ajuda, colocando a música totalmente, em termos de volume, acima do som ambiente, e sem nenhuma preocupação espacial quanto à origem do som. Já em Budapeste (a cidade) a direção musical parece se acertar.



A edição cumpre seu papel, talvez pudesse ter utilizado menos fades, mas corre no ritmo que a direção propôs. A fotografia é um muito bem realizada, predominantemente fria no Rio e quente em Budapeste. Linda a cena da estátua de Lenin descendo o Danúbio (mais uma homenagem), e belíssima cena em que Costa e Kriska (Garbiella Hámori) têm seu primeiro diálogo, enquanto ela patina. Logo em seguida, assim que param, no meio da cena, há uma abrupta mudança de luminância (tons brancos e pretos com os cinzas que contém), pode ter sido da cópia que assisti, ou talvez o tape to tape (a lapidação da fotografia cena a cena na pós-produção) tenha tido uma emenda mal corrigida. A cena onírica do escritor anônimo ficou forçada, pareceu teatral demais, com o fog (fumaça branca) vindo de trás do personagem que era quase que a morte de o Sétimo Selo (mais uma).



No final o personagem de Kósta olha para a câmera (mais homenagem), e explode o que chamamos de quarta parede, ou seja assume que aquilo é um filme, um espelho revela a câmera (outra homenagem) e escutamos o diretor hungáro e o brasileiro cortando a cena. Este recurso é muito delicado, pois cria um efeito que pode ser traduzido do alemão pro português como estranhamento, ou afastamento. (quem estudou bem o assunto foi Bertold Brecht, teatrólogo comunista e revolucionário alemão), Neste momento o epectador lembra que tudo não passa de uma ficção, e ao invés de usar a emoção na sua relação com o filme, utiliza a reflexão, para criticar a si e seu mundo social, ou político. O objetivo do estranhamento de Brecht era a revolução socialista, num período em que ocorreram as guerras mundiais, o nazismo, as revoluções operárias e a expansão do socialismo soviético. Brecht propunha a reflexão proletáriaoptado não pelo estranhamento crítico das cenas, mas ao contrário, com seu tom melodramático, forçou no sentido contrário, o emocional.

O roteiro vai lentamente misturando a realidade de Costa com os seus livros e a realidade que constrói para si. Creio que o roteiro se coloca muito bem. Não creio que era a intensão do roteiro dar a Costa dúvidas quanto ao seu amor por Vanda (Geovanna Antonelli) como a imprensa vem noticiando, pelo contrário, ele não vive sua realidade com Vanda, e seu filho em comum é descontruído no filme, gordinho, sempre dormindo, com farelos de comida na roupa. Talvez entre a virada final e o clímax (onde o personagem enfrenta o conflito motriz do filme), houve um tempo demasiado.

Fiquei na espectativa
de como seriam as ruas de Budapeste, já que no livro elas levam os nomes de joagaderes de futebol, mas um livro é um livro, assim como um filme a partir de um livro deve esquecê-lo e ter sua vida própria.




Aumentou minha vontade de visitar a cidade.











@cajuínas

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