Artigo publicado no blog: interney
Twitter do Alex Castro: AlexcastroLLL
Kindle Brasil FAQ
Muito bem. Cedi. Eu, que não sou tecnófilo nem consumista, comprei o tal do Kindle. Adorei. Apaixonei. Comprei há uma semana e ainda não larguei. Como todo mundo tem mil perguntas, decidi escrever um pequeno FAQ. Podem ir fazendo mais perguntas.
O que te fez comprar o Kindle agora?
O Kindle lê arquivos num formato lá que só a Amazon tem. Mas a partir da última atualização, ele incorporou um leitor nativo de PDFs. Como eu tenho mil teses e artigos acadêmicos em PDF pra ler, que eu nunca leio, achei que era uma excelente desculpa pra comprar o Kindle. E foi ótimo, pois estou de fato lendo essa trolha toda que eu estava pra ler há anos e não lia.
E lê bem os PDFs mesmo?
Sim e não. O tal leitor nativo de PDFs é bom, mas não tem zoom. Então, dependendo da formatação do PDF e do tamanho da fonte, fica difícil de ler. Por outro lado, você pode converter os PDFs para formato Kindle e, fazendo isso, fica com acesso a todas as funcionalidades (como aumentar e diminuir fonte). Descobri o seguinte: se o PDF não tem muita formatação complicada, vale a pena converter; se ele é especialmente bonito e arrumadinho, melhor ler em PDF mesmo; se ele for muito elaborado e cheio de detalhes (por exemplo, quadrinhos), não rola, porque aí sim fica impossível de ler em PDF, por um lado, e, por outro, se perderia tudo na conversão. Mas tirando os meus PDFs de quadrinhos, todos os outros estou lendo no Kindle muito feliz.
Como é isso de converter arquivos?
É meio 1984, mas funciona assim. Você pega seus arquivos, manda pra Amazon por email, eles convertem pra formato kindle e ou 1) te mandam de volta pro mesmo email, ou 2) cobram uns caraminguás para mandar tudo direto pro seu kindle. Na primeira opção, você recebe os arquivos de volta por email, baixa pro seu computador e passa pro Kindle via USB. Tenho feito isso direto. O método é meio tortuoso, e não gosto muito da idéia de mandar todos meus arquivos pra Amazon, mas tem funcionado direitinho. A não ser quando o documento original tem muita formatação elaborada, a conversão fica perfeita. Alguns dos formatos que a Amazon converte pra Kindle: doc, txt, rtf, html, pdf, etc etc. Outro dia, Doni me mandou o TCC dele em doc, converti, li no meu Kindle na mesma tarde. Delícia.
Na prática, como funciona esse Kindle?
Você compra o aparelho. Recebe. Vai na Amazon. Escolhe livros. Pode pedir pra mandar uma amostra pro seu kindle. Compra o livro. Ele é baixado direto pro Kindle. Você lê. Pronto.
E isso funciona no Brasil?
Teoricamente sim. Nos EUA, o Kindle está sempre conectado à internet e de graça. A qualquer momento, eu posso ir na Amazon pelo próprio Kindle, comprar um livro e baixar. No exterior, teoricamente, o Kindle também está sempre conectado (a área de abrangência é enorme, cobre quase todo o Brasil) mas eles cobram um adicional de poucos dólares por download. Mas também tem como fugir. No Brasil, por exemplo, vale mais a pena comprar seus livros no seu computador pelo preço normal, baixá-los pro seu HD e transferi-los pro Kindle via USB.
Cara, financeiramente, pra quem está no Brasil, vale a pena?
Vale. A não ser que você tenha aquele fetiche de cheiro de livro, vale. Sabe por quê? É assim. A maioria dos livros pra Kindle é bem mais barata do que o normal. A Amazon recomenda um preço de US$ 9,99 e, de fato, quase todo livro sai por esse preço. Então, pensa comigo. Em março, sai o novo livro doIan McEwan, Solar. Estou louco pra ler. Se estivesse no Brasil, teria que pagar uns US$26 pelo hardcover, mais uma grana forte de shipping - que nem sei mais quanto é porque não moro mais aí - além de esperar semanas pelo livro chegar. Tendo o Kindle, eu pagaria somente os US$ 9,99 (mais uns dois dólares se não quiser ter o ínfimo trabalho de baixar pro meu computador e transferir pro Kindle via USB ), não tem shipping, não tem espera, e posso começar a de fato ler o livro uns três minutos depois de ele ser lançado. Ou seja, pra quem está no exterior, vale a pena o Kindle só pra fugir do caríssimo shipping e da longa espera. Eu diria que o Kindle vale MAIS a pena para quem não está nos EUA.
E preciso comprar o aparelhinho pra ler o livro?
Eu sei o que você está pensando, amigo economista. Pra fazer essa economia de algumas dezenas de dólares, eu tenho que gastar algumas centenas de dólares comprando o aparelho. Grandes merda, você diz. Mas tem uma coisa bem legal. A Amazon também oferece, gratuitamente, um software chamado Kindle for PC, que eu já estava usando muitos meses antes de ter o próprio Kindle. Então, no cenário acima, você nem precisa *comprar* o aparelho Kindle pra começar a ler o livrinho na hora pagando menos: basta instalar o programa no seu computador, comprar o arquivo, fazer o download e ler. Eu não sei você, mas pra quem não tem tara de papel, é quase irresistível. Ah, parece que o Kindle for PC ainda não tem pra Mac, mas já tá saindo.
Bem, mas então estou restrito ao livros que posso comprar pela Amazon?
Só se você quiser. Já estou com uns 200 livros no meu kindle e só comprei dois pela Amazon. Por um lado, o Kindle é ótimo para livros novíssimos recém-lançados que você quer ler logo, mas é melhor ainda para livros antigos que estão em domínio público. Existem trocentos trilhões de sites de ebooks gratuitos na internet, oferecidos em vários formatos, de html a pdf, de txt a doc, alguns sites até mesmo já oferecendo os arquivos em formato kindle. Claro que são somente livros antigos, em domínio público, mas a maioria dos livros que leio são assim mesmo. Whitman, Thoreau, Veblen, José de Alencar, Machado de Assis, Joaquim Nabuco, Joaquim Manuel de Macedo, Swift, Chesterton, Balzac, Villaverde, Turgenev, Conrad, Dostoievski, Tolstoi, Dumas, Tchecov, Sterne, Maupassant, Gibbon, Verne, Bierce, Flaubert, Fitzgerald. Esses são apenas alguns dos meus autores preferidos cujas obras eu achei nesses sites de ebooks gratuitos (como Projeto Gutemberg eManyBooks) e já coloquei no meu Kindle. Além disso, você pode pegar praticamente quaisquer artigos de texto que tenha no seu computador (daqueles que você está pra ler há anos e nunca lê) e colocar no seu Kindle também. Essa, aliás, foi minha principal motivação. Eu tinha dezenas de artigos e teses acadêmicas pra ler e, agora, finalmente, estou lendo.
Mas o saco é que estou restrito ao inglês, né?
Só se você quiser. De fato, a seleção da loja da Amazon é quase que só inglês, mas tem vários livros em outras línguas. Meu romance, Mulher de Um Homem Só, por exemplo, está sendo vendido lá também. O novo livro do Rubem Fonseca, se não me engano, será lançado em formato Kindle. A obra completa do Paulo Coelho em Kindle já está a venda pela Amazon. Mas, além disso, nos sites de ebooks gratuitos, tem muita coisa em português. O sitedominiopublico.gov.br é um verdadeiro tesouro de ebooks brasileiros. Minhas pesquisas são sobre a literatura brasileira do século XIX e eu rapidamente encontrei e baixei todas as obras dos nossos principais autores dessa época - e, mais legal ainda, muitas obras obscuras que estão fora de catálogo há mais de cem anos, que não vale mais a pena reeditar, mas que você encontra facilmente em forma de ebook. Existe uma certa justiça poética subversiva em ler, no meu kindle, um romance obscuro do Joaquim Manuel de Macedo, que teve só uma edição em 1863 e nunca mais foi reeditado. E tem mais. Eu, por exemplo, estudo literatura cubana e tenho muita dificuldade em ler as novidades literárias que estão rolando na ilha. Mas, como o governo cubano não liga muito pra isso de royalties e direitos autorais, os autores mais recentes acabam também oferecendo muito de sua produção em forma de ebooks gratuitos - o que pra mim é ótimo. Enfim, não sei qual é a sua praia, mas procura que você acha. Naturalmente, isso tem muito pouco a ver com o Kindle: você pode encontrar, baixar esses arquivos todos e ler no seu computador. A diferença é que ler no Kindle é muito mais confortável.
Achei interessante isso dos livros fora de catálogo. Como funciona?
Pois é. Os bibliófilos torcem o nariz pra ebook, mas não sabem o que estão perdendo. Eu, que não sou bibliófilo, sou literaturófilo, adoro. Eu passo grande parte do meu tempo garimpando por livros perdidos do século XIX que saíram de catálogo e nunca mais ninguém ouviu falar. Adoro. Não pelo objeto-livro em si, mas pelo *conteúdo*. E, agora, muitos desses podem ser encontrados na Internet. Dois exemplos:
A Amazon vende, em formato kindle, as obras completas de muitos autores em domínio público - quase todos aqueles que citei acima. Sou viciado emTurgenev, por exemplo. Já li tudo o que ele escreveu e que foi traduzido pro inglês, espanhol ou português. Mas estava restrito ao catálogo. Por meros US$ 5, comprei as obras completas dele em formato Kindle, incluindo não só todos os livros que eu já tinha lido, mas também uns cinco outros que eu só ouvira falar, que tinham sido traduzidos pro inglês na década de 1890 e raramente reeditados. Várias editoras virtuais oferecem pacotes semelhantes: o leitor tem a opção de garimpar essas obras individualmente nos sites de ebooks gratuitos ou pode pagar uma merreca (quase sempre por volta de US$ 3-5) para comprar as obras completas em um arquivo só. Ano passado, eu quase gastei uma fortuna comprando, um por um, todos os volumes da saga dos Três Mosqueteiros, do Dumas (20 Anos Depois, Angelo Pitou, etc, esses livros fora de catálogo há decadas até mesmo nos EUA): agora, paguei US$ 5 e tenho todos. A Penguin vende versões kindle dos seus livros também, mas cobra US$ 9,99 por livros clássicos que basicamente você pode baixar de graça: não acho que valha a pena pagar tanto só pela capinha bonita e pela introdução escrita por um mestrando de literatura em Oxford.
Outro exemplo, dessa vez do Brasil: o IEL da Unicamp tem um projeto chamado Caminhos do Romance, sobre os inícios do romance brasileiro nos séculos XVIII e XIX. Muitos dos romances mais obscuros e esquecidos da nossa história estão lá, transcritos ou escaneados pelos santos do IEL - e, agora, também moram no meu Kindle. Então, como eu disse, o Kindle é muito prático pra ler os últimos dos últimos lançamentos mas, do meu ponto de vista de arqueólogo literário, é ainda mais útil pra ler livros raros, esquecidos e obscuros que você simplesmente não encontra mais em papel. E podem anotar: cada vez mais, as editoras vão editar em formato kindle aqueles livros de interesse restrito, especialmente acadêmicos, sobre os quais elas ainda detém os direitos mas acham que não valem mais a pena publicar. Seria muita burrice não fazerem isso.
Vamos à parte técnica, Alex. Chega de falar de livro velho que eu não quero ler. E a bateria?
Diz a Amazon que a bateria dura uma semana com o wireless ligado e duas semanas com o wireless desligado. Como o wireless só serve (teoricamente) pra você entrar em contato com a Amazon e comprar mais livros, não precisa mesmo ficar ligado. Você pode ligar na hora de comprar e desligar depois. Comigo, entretanto, uma bateria cheia terminou em dois dias, mas vamos lembrar que foram dois dias nos quais eu não larguei o bicho e fiquei baixando coisas via USB o tempo todo. Eu diria que deve durar uma semana mesmo.
E é confortável de pegar?
Todo mundo tem uma mão diferente, mas eu gostei bastante. É do tamanho de um livro e é feito de modo que você pode segurar e trocar de página com uma mão só. Bem prático.
E é confortável de ler?
Bem, eu não vejo nenhum problema em ler na tela. Você pode aumentar o tamanho da letra, o espaçamento das linhas, essas coisas. Sinto falta de uma opção de maior contraste.
É touch-screen?
Não.
Tem cheiro de livro?
Seu carro tem cheiro de cavalo?
Ahh, Alex, sério. Vale a pena comprar agora? Não é melhor esperar a tecnologia melhorar?
Olha, colega, a tecnologia está sempre melhorando. Tenho certeza que, em 2019, os carros vão estar muito melhores, mais desenvolvidos, mais ecológicos e tudo, mas não é por isso que vou passar os próximos dez anos pegando ônibus enquanto espero os carros melhorarem. Eu compro um carro agora e, em 2019, se tudo der certo, eu compro outro... Não sou tecnófilo. Não tenho iphone, gps, gadgets de modo geral. Tenho um ipod Shuffle porque ganhei de presente. Tudo depende das suas necessidades. Ou a tecnologia resolve um problema que você já tem ou não vale nada. Não deixe o mercado te convencer que você precisa de algo que nunca precisou antes. Pra mim, o Kindle já se pagou por 1) evitar carregar muito livro quando viajo (e eu viajo o tempo todo); 2) permitir que eu finalmente leia vários arquivos acadêmicos que eu tinha no meu computador e não lia nunca; 3) permitir que eu leia com conforto vários arquivos que tinha que ler no computador, especialmente os de livros obscuros do século XIX aos quais eu só tinha acesso em forma de ebook; 4) me dar acesso rápido e mais barato à novíssima produção literária (por enquanto, só em inglês, mas estou torcendo pra poder ler o Galera no meu Kindle em breve).
Eu estou achando a maior graça porque quase tudo isso que você está falando se aplica não ao Kindle, mas a ebooks de modo geral, uma coisa mais antiga que andar pra frente.
Bem, sim. Eu sou velho leitor de ebooks. Em 2002, o ano mais pobre, mais feliz e mais intelectualmente revolucionário da minha vida, só comprei dois livros: as leituras mais influentes que já fiz foram quase todas em ebook, na tela do computador. E, deixa eu contar pra vocês, Emerson, Thoreau, Kerouac, Whitman, não dependem de papel pra nada. Seu conteúdo seria revolucionário mesmo se você os lesse escritos na areia da praia, quem dirá na tela do computador. No ano seguinte, escrevi As Prisões e abri o LLL.
É verdade que dá pra ouvir música no Kindle?
Sim. Você coloca seus MP3s via USB e ouve normalmente. E tem a grande vantagem de não precisar de iTunes, um dos piores programas jamais inventados.
Então, funciona como um pen drive?
Sim, dá pra usar o Kindle pra carregar seus arquivos sim. Mas não se empolga, porque só cabem 1,5Gb.
E dá pra ouvir audiobooks?
Sim. De três jeitos. Se forem em formato audible, tem uma interface bonitinha que funciona bem. Se forem em MP3, nem tanto, porque pra ouvir MP3 nem tem interface: só liga e desliga e aumenta e diminui volume. Não dá pra pausar, pular, trocar faixa, nada. Por fim, no caso de livros recentes que habilitem essa função, ele tem um software que pega o texto e lê alto pra você. É impressionante o avanço dessa tecnologia: há poucos anos atrás, um instituto de leituras pra cegos fez uma versão assim do Mulher de Um Homem Só e o texto parecia, literalmente, estar sendo lido por um robô não muito esperto. Agora, a leitura é ótima: parece uma pessoa normal lendo em um ritmo um pouquinho fora de compasso. Como o programa é feito pra ler textos em inglês, foi muito engraçado quando tentou ler Mulher de Um Homem Só: parecia exatamente meus alunos americanos no primeiro mês de Português 101, ainda tentando falar as palavras da nossa língua com a pronúncia do inglês.
É verdade que dá pra ler blogs?
Eu digo que não leio blogs e ninguém acredita. Enfim, não tem nenhum blog que eu pagaria pra ler no Kindle. Só pra testar, adicionei o meu. A Amazon escolheu o preço: US$ 1,99 por mês (70% pra eles, 30% pra mim). Só disponível para clientes nos EUA. Quem pagar esse valor, vai receber cada novo post no meu blog direto no seu kindle. As vantagens são: 1) a conveniência e 2) poder ler tudo offline. As desvantagens são: 1) pagar por algo que você está acostumado a ler de graça; 2) pagar por algo pra ler com a formatação toda errada, numa interface que não foi feita pra ele. Via de regra, eu diria que não vale a pena. Sei lá, se você for um caixeiro-viajante, que vive na estrada, e quer acompanhar um desses blogs que atualiza várias vezes por dia, tipo Boing-Boing, tudo bem, o preço é barato mesmo (sério, o que mais você compra por US$ 1,99?), mas são casos bem específicos. Para clientes fora dos EUA, que pagam um adicional por cada download, com certeza não valeria a pena.
É verdade que dá pra ler revistas e jornais?
Verdade. Isso vale mais a pena. A Amazon permite trial-periods de duas semanas, e assinei O Globo, a New Yorker e The Atlantic.
A New Yorker, que eu já assino em papel, sai nas bancas na segunda de manhã, por US$ 4,99 o exemplar, e só chega aqui em casa, em Nova Orleans, na quinta ou sexta. Por míseros US$ 2,99 por mês, eu recebo quatro exemplares, diretamente no meu Kindle, no domingo à noite, quase um dia antes de sair nas bancas. Como sempre, se você não tem tara por papel, já valeria a pena só pelo preço. Se você trabalha e escreve sobre literatura, ler a New Yorker com tanta antecedência quer dizer que seu texto, post ou matéria sobre a surra que o Auster levou do James Wood, por exemplo, pode chegar ao seu leitor antes mesmo da própria New Yorker. Além disso, a versão Kindle foi claramente feita com muito cuidado, o design fechadinho, dá pra ler com gosto. Ah, e os cartuns ficam separados numa seção só pra eles. Confesso que acho mais legal ler os cartuns separados, dando atenção individual pra cada um, do que espalhados no meio das matérias. Por outro lado, as poucas fotos (quase sempre incríveis) não aparecem.
Já O Globo é um jornal que eu já assinei e com o qual nunca tive uma relação afetiva: o jornal da minha casa na minha infância era um JB que não existe mais. Depois de velho, na impossibilidade de ler o jornal que atualmente leva o nome de JB, passei a ler O Globo, mas sempre com um olhar mais adulto, distante, essas coisas. Até hoje, quando estou no Rio, ainda compro o JB na banca umas duas vezes por semana, só por nostalgia. Enfim, isso tudo foi pra dizer que hoje eu acordei e, antes de levantar, peguei o Kindle do lado da minha cama e comecei a ler O Globo. Olha, foi uma experiência estranha. Vamos lembrar que sou um expatriado saudoso, com muita vontade de voltar pra casa, que usa a internet tanto pra ler jornais quanto pra ouvir rádios do Rio. E, mesmo assim, a experiência de ler a porra do Globo na minha cama, mesmo que seja num aparelhinho esquisito, com uma interface não tão boa quanto à do New Yorker, ainda assim foi uma coisa emocionante, mexeu ali num fonte oculta de nostalgia e saudosismo que eu nem sabia que eu tinha. Como se ler O Globo no computador fosse uma coisa que faço de longe, mas ler O Globo na cama (um jornal, repito, com o qual eu não tenho uma relação afetiva) fosse a experiência carioca por definição, fosse um pouco como estar de verdade em casa, de um modo assustadoramente real que até me deixou arrepiado na hora e arrepiado agora escrevendo isso. Mas, enfim, ainda assim, ao contrário da New Yorker, é caro: US$ 9,99 por mês, pra receber o jornal somente uma vez por dia, sem atualizações ao longo do dia, sem as fotos e recursos gráficos da edição impressa e, pior, sem os recursos interativos da versão que leio de graça na internet. A emoção que senti ao ler O Globo no Kindle me surpreendeu, mas acho que prefiro levantar, andar literalmente dois passos e ler mais e melhor e de graça na internet.
Dá pra assinar esses jornais e revistas do Brasil?
Aparentemente, não. Teoricamente, você poderia assinar, baixar no seu computador e transferir pro Kindle via USB, mas a Amazon só vende as assinaturas pra clientes que estejam nos EUA. Pelo menos por enquanto.
Então, o Kindle fica o tempo todo conectado à internet, mas só se conecta ao site da Amazon, é isso?
Na área de produtos experimentais, tem um browserzinho que te permite navegar na internet de forma muito rudimentar. Apesar disso, para os luditas que não têm blueberries e blacktooths como eu, quebra o maior galho. Dá pra usar o Google ou o Google Maps, twittar, checar o Gmail e até mesmo ler O Globo sem pagar US$ 9,99 por mês. A interface é tosca, é lenta, não foi feito pra se usar sempre, mas está lá. Provavelmente não funciona no Brasil.
E os outros readers no mercado, Alex? Como o tal da Sony e o da Barnes & Noble?
Bem, eu estou fazendo uma tese agora, e queria ler meus artigos acadêmicos em pdf agora, e o Nook, da Barnes & Noble, só começaria a ser enviado em janeiro de 2010. Então, comprei o Kindle. Nunca vi nenhum dos outros, não sei se são bons, mas o Nook tem a grande, enorme vantagem de ler os livros que estão disponíveis por Google Books. Estou na torcida pra Amazon e Google se acertarem e o Kindle fazer o mesmo, mas as duas empresas andam brigando e não tenho muitas esperanças.
Ah, Alex, qual é a graça de ler um livro que não dá pra sublinhar ou anotar?
Pô, amigo, você nunca viu um ebook na vida então. Lá nos idos de 2002, quando nem tínhamos Google ou água corrente, eu já lia ebooks no meu computador e anotava tudo. Minha cópia de Desobediência Civil tem mais anotações que o próprio livro. No Kindle, você pode sublinhar trechos de livros e escrever anotações. Essas notas ficam vinculadas ao livro, mas num arquivo txt separado: esse arquivo pode ser subsequentemente baixado no seu computador e você pode usar os seus trechos sublinhados ou anotados como quiser. Por exemplo: digamos que você vai escrever um artigo sobre o livro X. Você lê o livro no Kindle, sublinha os trechos que quer citar e, depois, passa esse arquivo pro seu computador e copia e cola pro seu texto. Nada de ficar horas redigitando textos, graças a Shakespeare.
O Kindle tem um dicionário embutido?
Sim. Basta colocar o cursor em cima de uma palavra e ele dá a definição. Se quiser mais detalhes, você clica e vê o verbete completo. Naturalmente, só em inglês. Mas isso quer dizer o seguinte: muitos textos antigos hoje só são completamente compreensíveis com uma boa edição anotada. Eu tenho o inglês quase nativo e um excelente vocabulário mas, mesmo assim,Shakespeare é difícil. O grande mérito do bardo é que ele é tão, mas tão bom, que não perde o ritmo mesmo quando lido por gente que já não conhece muitas das suas palavras. Pra quase todo mundo, Shakespeare estar em domínio público não quer dizer nada, pois ler Romeu & Julieta, no computador, sem notas explicativas, não adiantaria muito. Agora, não mais. Você pode baixar livros antigos ou difíceis e, em caso de dúvida, a definição das palavras está a um clique de distância. Porra, isso é um ganho de qualidade de leitura do caralho.
Teatro completo de Shakespeare por R$245
Pode ler na praia? Pegando sol? Comendo?
Teoricamente sim. A Amazon vende o Kindle como sendo a solução para esse problema. Não seria frágil como um laptop. A tela teoricamente pode ser lida mesmo debaixo de sol. Etc. Isso é o que ela diz. Eu não testei. O Kindle é tão delicado e fininho e leve que acaba parecendo frágil. Planejo levar o meu pra cima e pra baixo mesmo, mas não vou testar sua durabilidade de propósito: depois que ele cair no chão pela primeira vez, eu conto o que acontecer.
Dá pra guardar os arquivos no seu computador?
Dá. Você pode fazer um back-up de todos os seus livros no seu HD.
Há pouco tempo, por problemas de licenciamento, a Amazon entrou nos Kindles de seus cliente que tinha comprado (of all books!) 1984, do Orwell, e apagou o livro. E se fizerem de novo?
Olha, o escândalo foi tão grande que acho que não ousariam.
Dá pra ler PDFs desprotegidos nele?
Dá. Não só você pode colocar seus próprios PDFs e lê-los como tal, você também pode convertê-los pra formato Kindle.
É possível inserir notas nos livros em pdf?
Não. Só se você converter o PDF pra formato Kindle.
As notas são independentes, ou ficam "presas" ao arquivo do livro?
Ambos. Elas aparecem no livro, mas também ficam em um arquivo separado que você pode baixar para o seu computador e editar.
Dá pra destacar, copiar trechos?
Sim.
Em arquivos pdf com fotos coloridas, ele faz automaticamente a conversão para escala de cinza, ou não abre?
Faz a conversão automaticamente.
Como funciona a sincronização com o PC? É um software específico, ou basta o drag-and-drop?
Drag and drop.
Tem como colocar um arquivo sem que seja uma permissão da Amazon?
Sim. Literalmente qualquer arquivo que você quiser - pois funciona como pendrive também. A máquina lê formato kindle e pdf, e outros mil formatos você pode converter pra formato kindle.
O tecladinho é user-friendly, ou é difícil escrever nele?
Ambos. Ele é user-friendly e é difícil escrever nele. É o melhor teclado possível pro tamanho que ocupa. Se fosse maior, seria inviável. Dá pra escrever notas e comentários numa boa, mas, de fato, não é um teclado pra você escrever um texto.
Dá pra inserir um link de um trecho para outro, no mesmo livro ou em livros diferentes? Tipo, fazer uma frase de Crime e Castigo remeter a uma frase de Guerra e Paz, etc?
Não mesmo.
Ele é confortável para os olhos, ou ler nele cansa mais do que ler num livro normal?
Bem confortável - pra ler continuamente. Não é uma máquina pra browse ou folhear - aí sim, cansa o olho. Mas pra sentar e ler uma página de cada vez é uma delícia.
A máquina esquenta, tornando desagradável segurá-la?
Excelente pergunta. Só agora me dei conta disso. Incrível. Já fiquei o dia inteiro segurando o kindle e ele não esquenta NADA. Nenhum aumento perceptível de temperatura.
Você recomenda o Kindle normal ou o Kindle DX?
Olha, eu tenho o normal e nunca vi o DX. Mas ele é quase o dobro do preço e não sei se vale a pena. As vantagens são 1) tela maior e 2) maior capacidade de armazenamento. O problema é que uma tela maior também quer dizer um aparelho maior pra carregar e mais pesado pra segurar - ainda mais com uma só mão. Acho o Kindle do tamanho perfeito - do tamanho de um livro. O DX, pelo que parece, é do tamanho de uma revista. Quanto à capacidade de armazenamento, é legal, mas não vale a pena dar $200 adicionais nisso. Se você lotar seu kindle, sempre pode guardar seus arquivos no seu próprio HD.
Comparação de tamanho entre o Kindle e o Kindle DX
É verdade que com o Kindle a gente lê mais e gasta mais?
Sim. Sim. Desde o Kindle chegou, eu, que já não leio pouco, estou lendo exponencialmente mais. E também já comprei vários livros que não teria comprado se não fosse o Kindle. Como, por exemplo, abaixo:
* * *
Um caso exemplar:
Assinei a New Yorker pelo Kindle. Ela sai nas bancas na segunda, chega aqui em casa na quinta, mas já no domingo à noite eu estava lendo. Uma das resenhas era sobre uma nova tradução do The Canterbury Tales. Adorei a resenha e pensei: é verdade, estou pra ler esse livro há anos. Ali mesmo, sem me levantar da cadeira de balanço da minha varanda, eu entrei na Amazon, comprei a nova tradução da Oxford (por apenas $7), li a introdução e a história da Wife of Bath. Sim, por um lado, estimula o consumismo: comprei um livro que, normalmente, não compraria. Por outro lado, porra, que delícia. Ler a resenha, gostar, apertar um botão e já estar lendo o livro!
* * *
Veredito final:
O Kindle é perfeito para DUAS coisas:
1) Livros que você lê por prazer, em uma leitura lenta e contínua, página por página, com começo, meio e fim. O aparelho é gostoso de ler, de segurar, a bateria dura, tudo de bom. Como a maioria das pessoas lê assim, acho que o Kindle resolve o problema de quase todo mundo.
2) Livros para pesquisa, que você precise tanto buscar por termos específicos da sua pesquisa como fazer muitas anotações e citar longos trechos.
Só quem está no meio acadêmico sabe o tempo que se perde passando os olhos por todas as páginas de um livro sem índice onomástico para encontrar as menções à Fulano. Ou o tempo que se perde redigitando todos os longos trechos que você vai citar no seu trabalho, ou todas as longas notas, em letrinha miúda, que você escreveu nas margens.
Com o Kindle esse trabalho some. É mágico. A busca te permite encontrar rapidamente os termos que você quer, e tudo o que você sublinhou ou anotou está disponível num arquivo txt que você baixa no seu computador.
O Kindle NÃO é bom para:
1) Folhear.
Existe uma troca bem clara: você ganha a opção de buscar mas perde a de folhear. Passar rapidamente as páginas do livro é chato, lento e dá dor-de-cabeça. Ou você lê direto ou você busca: pular daqui pra lá e de lá pra cá é proibitivamente cansativo.
Um exemplo: The Canterbury Tales, citado acima, apesar de a compra do livro ter sido um excelente exemplo da conveniência do Kindle, também é um exemplo perfeito do tipo de livro que eu NÃO deveria ter comprado no Kindle. Porque não é nem um livro (como um romance) que vou ler sequencialmente do começo ao fim, e nem é um livro que vou usar numa tese: pelo contrário, seria um livro que eu gostaria de folhear longamente, olhar um pouco de cada história, decidir se agora quero ler a história do Knight ou do Friar, etc. Para isso, o Kindle é um saco.
* * *
A coisa mais irritante do Kindle: não dar pra criar pastas e subpastas pra organização dos livros. Sério. Depois de um certo número, fica muito chato de encontrar os livros lá dentro. Não pode ser tão difícil assim de criar!
* * *
Enfim, eu gostei, estou apaixonado, recomendo. Mais perguntas, deixem nos comentários e eu respondo aqui. E não, infelizmente não, esse não é um post patrocinado e não vou receber nem um centavo da Amazon. Se gostaram, se o texto foi útil, considerem comprar um dos meus livros. Ou comprem alguma coisa no Submarino entrando aqui pelo blog e eu ganho uns caraminguás. A casa agradece.
@cajuínas
O que te fez comprar o Kindle agora?
O Kindle lê arquivos num formato lá que só a Amazon tem. Mas a partir da última atualização, ele incorporou um leitor nativo de PDFs. Como eu tenho mil teses e artigos acadêmicos em PDF pra ler, que eu nunca leio, achei que era uma excelente desculpa pra comprar o Kindle. E foi ótimo, pois estou de fato lendo essa trolha toda que eu estava pra ler há anos e não lia.
E lê bem os PDFs mesmo?
Sim e não. O tal leitor nativo de PDFs é bom, mas não tem zoom. Então, dependendo da formatação do PDF e do tamanho da fonte, fica difícil de ler. Por outro lado, você pode converter os PDFs para formato Kindle e, fazendo isso, fica com acesso a todas as funcionalidades (como aumentar e diminuir fonte). Descobri o seguinte: se o PDF não tem muita formatação complicada, vale a pena converter; se ele é especialmente bonito e arrumadinho, melhor ler em PDF mesmo; se ele for muito elaborado e cheio de detalhes (por exemplo, quadrinhos), não rola, porque aí sim fica impossível de ler em PDF, por um lado, e, por outro, se perderia tudo na conversão. Mas tirando os meus PDFs de quadrinhos, todos os outros estou lendo no Kindle muito feliz.
Como é isso de converter arquivos?
É meio 1984, mas funciona assim. Você pega seus arquivos, manda pra Amazon por email, eles convertem pra formato kindle e ou 1) te mandam de volta pro mesmo email, ou 2) cobram uns caraminguás para mandar tudo direto pro seu kindle. Na primeira opção, você recebe os arquivos de volta por email, baixa pro seu computador e passa pro Kindle via USB. Tenho feito isso direto. O método é meio tortuoso, e não gosto muito da idéia de mandar todos meus arquivos pra Amazon, mas tem funcionado direitinho. A não ser quando o documento original tem muita formatação elaborada, a conversão fica perfeita. Alguns dos formatos que a Amazon converte pra Kindle: doc, txt, rtf, html, pdf, etc etc. Outro dia, Doni me mandou o TCC dele em doc, converti, li no meu Kindle na mesma tarde. Delícia.
Na prática, como funciona esse Kindle?
Você compra o aparelho. Recebe. Vai na Amazon. Escolhe livros. Pode pedir pra mandar uma amostra pro seu kindle. Compra o livro. Ele é baixado direto pro Kindle. Você lê. Pronto.
E isso funciona no Brasil?
Teoricamente sim. Nos EUA, o Kindle está sempre conectado à internet e de graça. A qualquer momento, eu posso ir na Amazon pelo próprio Kindle, comprar um livro e baixar. No exterior, teoricamente, o Kindle também está sempre conectado (a área de abrangência é enorme, cobre quase todo o Brasil) mas eles cobram um adicional de poucos dólares por download. Mas também tem como fugir. No Brasil, por exemplo, vale mais a pena comprar seus livros no seu computador pelo preço normal, baixá-los pro seu HD e transferi-los pro Kindle via USB.
Cara, financeiramente, pra quem está no Brasil, vale a pena?
Vale. A não ser que você tenha aquele fetiche de cheiro de livro, vale. Sabe por quê? É assim. A maioria dos livros pra Kindle é bem mais barata do que o normal. A Amazon recomenda um preço de US$ 9,99 e, de fato, quase todo livro sai por esse preço. Então, pensa comigo. Em março, sai o novo livro doIan McEwan, Solar. Estou louco pra ler. Se estivesse no Brasil, teria que pagar uns US$26 pelo hardcover, mais uma grana forte de shipping - que nem sei mais quanto é porque não moro mais aí - além de esperar semanas pelo livro chegar. Tendo o Kindle, eu pagaria somente os US$ 9,99 (mais uns dois dólares se não quiser ter o ínfimo trabalho de baixar pro meu computador e transferir pro Kindle via USB ), não tem shipping, não tem espera, e posso começar a de fato ler o livro uns três minutos depois de ele ser lançado. Ou seja, pra quem está no exterior, vale a pena o Kindle só pra fugir do caríssimo shipping e da longa espera. Eu diria que o Kindle vale MAIS a pena para quem não está nos EUA.
E preciso comprar o aparelhinho pra ler o livro?
Eu sei o que você está pensando, amigo economista. Pra fazer essa economia de algumas dezenas de dólares, eu tenho que gastar algumas centenas de dólares comprando o aparelho. Grandes merda, você diz. Mas tem uma coisa bem legal. A Amazon também oferece, gratuitamente, um software chamado Kindle for PC, que eu já estava usando muitos meses antes de ter o próprio Kindle. Então, no cenário acima, você nem precisa *comprar* o aparelho Kindle pra começar a ler o livrinho na hora pagando menos: basta instalar o programa no seu computador, comprar o arquivo, fazer o download e ler. Eu não sei você, mas pra quem não tem tara de papel, é quase irresistível. Ah, parece que o Kindle for PC ainda não tem pra Mac, mas já tá saindo.
Bem, mas então estou restrito ao livros que posso comprar pela Amazon?
Só se você quiser. Já estou com uns 200 livros no meu kindle e só comprei dois pela Amazon. Por um lado, o Kindle é ótimo para livros novíssimos recém-lançados que você quer ler logo, mas é melhor ainda para livros antigos que estão em domínio público. Existem trocentos trilhões de sites de ebooks gratuitos na internet, oferecidos em vários formatos, de html a pdf, de txt a doc, alguns sites até mesmo já oferecendo os arquivos em formato kindle. Claro que são somente livros antigos, em domínio público, mas a maioria dos livros que leio são assim mesmo. Whitman, Thoreau, Veblen, José de Alencar, Machado de Assis, Joaquim Nabuco, Joaquim Manuel de Macedo, Swift, Chesterton, Balzac, Villaverde, Turgenev, Conrad, Dostoievski, Tolstoi, Dumas, Tchecov, Sterne, Maupassant, Gibbon, Verne, Bierce, Flaubert, Fitzgerald. Esses são apenas alguns dos meus autores preferidos cujas obras eu achei nesses sites de ebooks gratuitos (como Projeto Gutemberg eManyBooks) e já coloquei no meu Kindle. Além disso, você pode pegar praticamente quaisquer artigos de texto que tenha no seu computador (daqueles que você está pra ler há anos e nunca lê) e colocar no seu Kindle também. Essa, aliás, foi minha principal motivação. Eu tinha dezenas de artigos e teses acadêmicas pra ler e, agora, finalmente, estou lendo.
Mas o saco é que estou restrito ao inglês, né?
Só se você quiser. De fato, a seleção da loja da Amazon é quase que só inglês, mas tem vários livros em outras línguas. Meu romance, Mulher de Um Homem Só, por exemplo, está sendo vendido lá também. O novo livro do Rubem Fonseca, se não me engano, será lançado em formato Kindle. A obra completa do Paulo Coelho em Kindle já está a venda pela Amazon. Mas, além disso, nos sites de ebooks gratuitos, tem muita coisa em português. O sitedominiopublico.gov.br é um verdadeiro tesouro de ebooks brasileiros. Minhas pesquisas são sobre a literatura brasileira do século XIX e eu rapidamente encontrei e baixei todas as obras dos nossos principais autores dessa época - e, mais legal ainda, muitas obras obscuras que estão fora de catálogo há mais de cem anos, que não vale mais a pena reeditar, mas que você encontra facilmente em forma de ebook. Existe uma certa justiça poética subversiva em ler, no meu kindle, um romance obscuro do Joaquim Manuel de Macedo, que teve só uma edição em 1863 e nunca mais foi reeditado. E tem mais. Eu, por exemplo, estudo literatura cubana e tenho muita dificuldade em ler as novidades literárias que estão rolando na ilha. Mas, como o governo cubano não liga muito pra isso de royalties e direitos autorais, os autores mais recentes acabam também oferecendo muito de sua produção em forma de ebooks gratuitos - o que pra mim é ótimo. Enfim, não sei qual é a sua praia, mas procura que você acha. Naturalmente, isso tem muito pouco a ver com o Kindle: você pode encontrar, baixar esses arquivos todos e ler no seu computador. A diferença é que ler no Kindle é muito mais confortável.
Achei interessante isso dos livros fora de catálogo. Como funciona?
Pois é. Os bibliófilos torcem o nariz pra ebook, mas não sabem o que estão perdendo. Eu, que não sou bibliófilo, sou literaturófilo, adoro. Eu passo grande parte do meu tempo garimpando por livros perdidos do século XIX que saíram de catálogo e nunca mais ninguém ouviu falar. Adoro. Não pelo objeto-livro em si, mas pelo *conteúdo*. E, agora, muitos desses podem ser encontrados na Internet. Dois exemplos:
A Amazon vende, em formato kindle, as obras completas de muitos autores em domínio público - quase todos aqueles que citei acima. Sou viciado emTurgenev, por exemplo. Já li tudo o que ele escreveu e que foi traduzido pro inglês, espanhol ou português. Mas estava restrito ao catálogo. Por meros US$ 5, comprei as obras completas dele em formato Kindle, incluindo não só todos os livros que eu já tinha lido, mas também uns cinco outros que eu só ouvira falar, que tinham sido traduzidos pro inglês na década de 1890 e raramente reeditados. Várias editoras virtuais oferecem pacotes semelhantes: o leitor tem a opção de garimpar essas obras individualmente nos sites de ebooks gratuitos ou pode pagar uma merreca (quase sempre por volta de US$ 3-5) para comprar as obras completas em um arquivo só. Ano passado, eu quase gastei uma fortuna comprando, um por um, todos os volumes da saga dos Três Mosqueteiros, do Dumas (20 Anos Depois, Angelo Pitou, etc, esses livros fora de catálogo há decadas até mesmo nos EUA): agora, paguei US$ 5 e tenho todos. A Penguin vende versões kindle dos seus livros também, mas cobra US$ 9,99 por livros clássicos que basicamente você pode baixar de graça: não acho que valha a pena pagar tanto só pela capinha bonita e pela introdução escrita por um mestrando de literatura em Oxford.
Outro exemplo, dessa vez do Brasil: o IEL da Unicamp tem um projeto chamado Caminhos do Romance, sobre os inícios do romance brasileiro nos séculos XVIII e XIX. Muitos dos romances mais obscuros e esquecidos da nossa história estão lá, transcritos ou escaneados pelos santos do IEL - e, agora, também moram no meu Kindle. Então, como eu disse, o Kindle é muito prático pra ler os últimos dos últimos lançamentos mas, do meu ponto de vista de arqueólogo literário, é ainda mais útil pra ler livros raros, esquecidos e obscuros que você simplesmente não encontra mais em papel. E podem anotar: cada vez mais, as editoras vão editar em formato kindle aqueles livros de interesse restrito, especialmente acadêmicos, sobre os quais elas ainda detém os direitos mas acham que não valem mais a pena publicar. Seria muita burrice não fazerem isso.
Vamos à parte técnica, Alex. Chega de falar de livro velho que eu não quero ler. E a bateria?
Diz a Amazon que a bateria dura uma semana com o wireless ligado e duas semanas com o wireless desligado. Como o wireless só serve (teoricamente) pra você entrar em contato com a Amazon e comprar mais livros, não precisa mesmo ficar ligado. Você pode ligar na hora de comprar e desligar depois. Comigo, entretanto, uma bateria cheia terminou em dois dias, mas vamos lembrar que foram dois dias nos quais eu não larguei o bicho e fiquei baixando coisas via USB o tempo todo. Eu diria que deve durar uma semana mesmo.
E é confortável de pegar?
Todo mundo tem uma mão diferente, mas eu gostei bastante. É do tamanho de um livro e é feito de modo que você pode segurar e trocar de página com uma mão só. Bem prático.
E é confortável de ler?
Bem, eu não vejo nenhum problema em ler na tela. Você pode aumentar o tamanho da letra, o espaçamento das linhas, essas coisas. Sinto falta de uma opção de maior contraste.
É touch-screen?
Não.
Tem cheiro de livro?
Seu carro tem cheiro de cavalo?
Ahh, Alex, sério. Vale a pena comprar agora? Não é melhor esperar a tecnologia melhorar?
Olha, colega, a tecnologia está sempre melhorando. Tenho certeza que, em 2019, os carros vão estar muito melhores, mais desenvolvidos, mais ecológicos e tudo, mas não é por isso que vou passar os próximos dez anos pegando ônibus enquanto espero os carros melhorarem. Eu compro um carro agora e, em 2019, se tudo der certo, eu compro outro... Não sou tecnófilo. Não tenho iphone, gps, gadgets de modo geral. Tenho um ipod Shuffle porque ganhei de presente. Tudo depende das suas necessidades. Ou a tecnologia resolve um problema que você já tem ou não vale nada. Não deixe o mercado te convencer que você precisa de algo que nunca precisou antes. Pra mim, o Kindle já se pagou por 1) evitar carregar muito livro quando viajo (e eu viajo o tempo todo); 2) permitir que eu finalmente leia vários arquivos acadêmicos que eu tinha no meu computador e não lia nunca; 3) permitir que eu leia com conforto vários arquivos que tinha que ler no computador, especialmente os de livros obscuros do século XIX aos quais eu só tinha acesso em forma de ebook; 4) me dar acesso rápido e mais barato à novíssima produção literária (por enquanto, só em inglês, mas estou torcendo pra poder ler o Galera no meu Kindle em breve).
Eu estou achando a maior graça porque quase tudo isso que você está falando se aplica não ao Kindle, mas a ebooks de modo geral, uma coisa mais antiga que andar pra frente.
Bem, sim. Eu sou velho leitor de ebooks. Em 2002, o ano mais pobre, mais feliz e mais intelectualmente revolucionário da minha vida, só comprei dois livros: as leituras mais influentes que já fiz foram quase todas em ebook, na tela do computador. E, deixa eu contar pra vocês, Emerson, Thoreau, Kerouac, Whitman, não dependem de papel pra nada. Seu conteúdo seria revolucionário mesmo se você os lesse escritos na areia da praia, quem dirá na tela do computador. No ano seguinte, escrevi As Prisões e abri o LLL.
É verdade que dá pra ouvir música no Kindle?
Sim. Você coloca seus MP3s via USB e ouve normalmente. E tem a grande vantagem de não precisar de iTunes, um dos piores programas jamais inventados.
Então, funciona como um pen drive?
Sim, dá pra usar o Kindle pra carregar seus arquivos sim. Mas não se empolga, porque só cabem 1,5Gb.
E dá pra ouvir audiobooks?
Sim. De três jeitos. Se forem em formato audible, tem uma interface bonitinha que funciona bem. Se forem em MP3, nem tanto, porque pra ouvir MP3 nem tem interface: só liga e desliga e aumenta e diminui volume. Não dá pra pausar, pular, trocar faixa, nada. Por fim, no caso de livros recentes que habilitem essa função, ele tem um software que pega o texto e lê alto pra você. É impressionante o avanço dessa tecnologia: há poucos anos atrás, um instituto de leituras pra cegos fez uma versão assim do Mulher de Um Homem Só e o texto parecia, literalmente, estar sendo lido por um robô não muito esperto. Agora, a leitura é ótima: parece uma pessoa normal lendo em um ritmo um pouquinho fora de compasso. Como o programa é feito pra ler textos em inglês, foi muito engraçado quando tentou ler Mulher de Um Homem Só: parecia exatamente meus alunos americanos no primeiro mês de Português 101, ainda tentando falar as palavras da nossa língua com a pronúncia do inglês.
É verdade que dá pra ler blogs?
Eu digo que não leio blogs e ninguém acredita. Enfim, não tem nenhum blog que eu pagaria pra ler no Kindle. Só pra testar, adicionei o meu. A Amazon escolheu o preço: US$ 1,99 por mês (70% pra eles, 30% pra mim). Só disponível para clientes nos EUA. Quem pagar esse valor, vai receber cada novo post no meu blog direto no seu kindle. As vantagens são: 1) a conveniência e 2) poder ler tudo offline. As desvantagens são: 1) pagar por algo que você está acostumado a ler de graça; 2) pagar por algo pra ler com a formatação toda errada, numa interface que não foi feita pra ele. Via de regra, eu diria que não vale a pena. Sei lá, se você for um caixeiro-viajante, que vive na estrada, e quer acompanhar um desses blogs que atualiza várias vezes por dia, tipo Boing-Boing, tudo bem, o preço é barato mesmo (sério, o que mais você compra por US$ 1,99?), mas são casos bem específicos. Para clientes fora dos EUA, que pagam um adicional por cada download, com certeza não valeria a pena.
É verdade que dá pra ler revistas e jornais?
Verdade. Isso vale mais a pena. A Amazon permite trial-periods de duas semanas, e assinei O Globo, a New Yorker e The Atlantic.
A New Yorker, que eu já assino em papel, sai nas bancas na segunda de manhã, por US$ 4,99 o exemplar, e só chega aqui em casa, em Nova Orleans, na quinta ou sexta. Por míseros US$ 2,99 por mês, eu recebo quatro exemplares, diretamente no meu Kindle, no domingo à noite, quase um dia antes de sair nas bancas. Como sempre, se você não tem tara por papel, já valeria a pena só pelo preço. Se você trabalha e escreve sobre literatura, ler a New Yorker com tanta antecedência quer dizer que seu texto, post ou matéria sobre a surra que o Auster levou do James Wood, por exemplo, pode chegar ao seu leitor antes mesmo da própria New Yorker. Além disso, a versão Kindle foi claramente feita com muito cuidado, o design fechadinho, dá pra ler com gosto. Ah, e os cartuns ficam separados numa seção só pra eles. Confesso que acho mais legal ler os cartuns separados, dando atenção individual pra cada um, do que espalhados no meio das matérias. Por outro lado, as poucas fotos (quase sempre incríveis) não aparecem.
Já O Globo é um jornal que eu já assinei e com o qual nunca tive uma relação afetiva: o jornal da minha casa na minha infância era um JB que não existe mais. Depois de velho, na impossibilidade de ler o jornal que atualmente leva o nome de JB, passei a ler O Globo, mas sempre com um olhar mais adulto, distante, essas coisas. Até hoje, quando estou no Rio, ainda compro o JB na banca umas duas vezes por semana, só por nostalgia. Enfim, isso tudo foi pra dizer que hoje eu acordei e, antes de levantar, peguei o Kindle do lado da minha cama e comecei a ler O Globo. Olha, foi uma experiência estranha. Vamos lembrar que sou um expatriado saudoso, com muita vontade de voltar pra casa, que usa a internet tanto pra ler jornais quanto pra ouvir rádios do Rio. E, mesmo assim, a experiência de ler a porra do Globo na minha cama, mesmo que seja num aparelhinho esquisito, com uma interface não tão boa quanto à do New Yorker, ainda assim foi uma coisa emocionante, mexeu ali num fonte oculta de nostalgia e saudosismo que eu nem sabia que eu tinha. Como se ler O Globo no computador fosse uma coisa que faço de longe, mas ler O Globo na cama (um jornal, repito, com o qual eu não tenho uma relação afetiva) fosse a experiência carioca por definição, fosse um pouco como estar de verdade em casa, de um modo assustadoramente real que até me deixou arrepiado na hora e arrepiado agora escrevendo isso. Mas, enfim, ainda assim, ao contrário da New Yorker, é caro: US$ 9,99 por mês, pra receber o jornal somente uma vez por dia, sem atualizações ao longo do dia, sem as fotos e recursos gráficos da edição impressa e, pior, sem os recursos interativos da versão que leio de graça na internet. A emoção que senti ao ler O Globo no Kindle me surpreendeu, mas acho que prefiro levantar, andar literalmente dois passos e ler mais e melhor e de graça na internet.
Dá pra assinar esses jornais e revistas do Brasil?
Aparentemente, não. Teoricamente, você poderia assinar, baixar no seu computador e transferir pro Kindle via USB, mas a Amazon só vende as assinaturas pra clientes que estejam nos EUA. Pelo menos por enquanto.
Então, o Kindle fica o tempo todo conectado à internet, mas só se conecta ao site da Amazon, é isso?
Na área de produtos experimentais, tem um browserzinho que te permite navegar na internet de forma muito rudimentar. Apesar disso, para os luditas que não têm blueberries e blacktooths como eu, quebra o maior galho. Dá pra usar o Google ou o Google Maps, twittar, checar o Gmail e até mesmo ler O Globo sem pagar US$ 9,99 por mês. A interface é tosca, é lenta, não foi feito pra se usar sempre, mas está lá. Provavelmente não funciona no Brasil.
E os outros readers no mercado, Alex? Como o tal da Sony e o da Barnes & Noble?
Bem, eu estou fazendo uma tese agora, e queria ler meus artigos acadêmicos em pdf agora, e o Nook, da Barnes & Noble, só começaria a ser enviado em janeiro de 2010. Então, comprei o Kindle. Nunca vi nenhum dos outros, não sei se são bons, mas o Nook tem a grande, enorme vantagem de ler os livros que estão disponíveis por Google Books. Estou na torcida pra Amazon e Google se acertarem e o Kindle fazer o mesmo, mas as duas empresas andam brigando e não tenho muitas esperanças.
Ah, Alex, qual é a graça de ler um livro que não dá pra sublinhar ou anotar?
Pô, amigo, você nunca viu um ebook na vida então. Lá nos idos de 2002, quando nem tínhamos Google ou água corrente, eu já lia ebooks no meu computador e anotava tudo. Minha cópia de Desobediência Civil tem mais anotações que o próprio livro. No Kindle, você pode sublinhar trechos de livros e escrever anotações. Essas notas ficam vinculadas ao livro, mas num arquivo txt separado: esse arquivo pode ser subsequentemente baixado no seu computador e você pode usar os seus trechos sublinhados ou anotados como quiser. Por exemplo: digamos que você vai escrever um artigo sobre o livro X. Você lê o livro no Kindle, sublinha os trechos que quer citar e, depois, passa esse arquivo pro seu computador e copia e cola pro seu texto. Nada de ficar horas redigitando textos, graças a Shakespeare.
O Kindle tem um dicionário embutido?
Sim. Basta colocar o cursor em cima de uma palavra e ele dá a definição. Se quiser mais detalhes, você clica e vê o verbete completo. Naturalmente, só em inglês. Mas isso quer dizer o seguinte: muitos textos antigos hoje só são completamente compreensíveis com uma boa edição anotada. Eu tenho o inglês quase nativo e um excelente vocabulário mas, mesmo assim,Shakespeare é difícil. O grande mérito do bardo é que ele é tão, mas tão bom, que não perde o ritmo mesmo quando lido por gente que já não conhece muitas das suas palavras. Pra quase todo mundo, Shakespeare estar em domínio público não quer dizer nada, pois ler Romeu & Julieta, no computador, sem notas explicativas, não adiantaria muito. Agora, não mais. Você pode baixar livros antigos ou difíceis e, em caso de dúvida, a definição das palavras está a um clique de distância. Porra, isso é um ganho de qualidade de leitura do caralho.
Teatro completo de Shakespeare por R$245
Pode ler na praia? Pegando sol? Comendo?
Teoricamente sim. A Amazon vende o Kindle como sendo a solução para esse problema. Não seria frágil como um laptop. A tela teoricamente pode ser lida mesmo debaixo de sol. Etc. Isso é o que ela diz. Eu não testei. O Kindle é tão delicado e fininho e leve que acaba parecendo frágil. Planejo levar o meu pra cima e pra baixo mesmo, mas não vou testar sua durabilidade de propósito: depois que ele cair no chão pela primeira vez, eu conto o que acontecer.
Dá pra guardar os arquivos no seu computador?
Dá. Você pode fazer um back-up de todos os seus livros no seu HD.
Há pouco tempo, por problemas de licenciamento, a Amazon entrou nos Kindles de seus cliente que tinha comprado (of all books!) 1984, do Orwell, e apagou o livro. E se fizerem de novo?
Olha, o escândalo foi tão grande que acho que não ousariam.
Dá pra ler PDFs desprotegidos nele?
Dá. Não só você pode colocar seus próprios PDFs e lê-los como tal, você também pode convertê-los pra formato Kindle.
É possível inserir notas nos livros em pdf?
Não. Só se você converter o PDF pra formato Kindle.
As notas são independentes, ou ficam "presas" ao arquivo do livro?
Ambos. Elas aparecem no livro, mas também ficam em um arquivo separado que você pode baixar para o seu computador e editar.
Dá pra destacar, copiar trechos?
Sim.
Em arquivos pdf com fotos coloridas, ele faz automaticamente a conversão para escala de cinza, ou não abre?
Faz a conversão automaticamente.
Como funciona a sincronização com o PC? É um software específico, ou basta o drag-and-drop?
Drag and drop.
Tem como colocar um arquivo sem que seja uma permissão da Amazon?
Sim. Literalmente qualquer arquivo que você quiser - pois funciona como pendrive também. A máquina lê formato kindle e pdf, e outros mil formatos você pode converter pra formato kindle.
O tecladinho é user-friendly, ou é difícil escrever nele?
Ambos. Ele é user-friendly e é difícil escrever nele. É o melhor teclado possível pro tamanho que ocupa. Se fosse maior, seria inviável. Dá pra escrever notas e comentários numa boa, mas, de fato, não é um teclado pra você escrever um texto.
Dá pra inserir um link de um trecho para outro, no mesmo livro ou em livros diferentes? Tipo, fazer uma frase de Crime e Castigo remeter a uma frase de Guerra e Paz, etc?
Não mesmo.
Ele é confortável para os olhos, ou ler nele cansa mais do que ler num livro normal?
Bem confortável - pra ler continuamente. Não é uma máquina pra browse ou folhear - aí sim, cansa o olho. Mas pra sentar e ler uma página de cada vez é uma delícia.
A máquina esquenta, tornando desagradável segurá-la?
Excelente pergunta. Só agora me dei conta disso. Incrível. Já fiquei o dia inteiro segurando o kindle e ele não esquenta NADA. Nenhum aumento perceptível de temperatura.
Você recomenda o Kindle normal ou o Kindle DX?
Olha, eu tenho o normal e nunca vi o DX. Mas ele é quase o dobro do preço e não sei se vale a pena. As vantagens são 1) tela maior e 2) maior capacidade de armazenamento. O problema é que uma tela maior também quer dizer um aparelho maior pra carregar e mais pesado pra segurar - ainda mais com uma só mão. Acho o Kindle do tamanho perfeito - do tamanho de um livro. O DX, pelo que parece, é do tamanho de uma revista. Quanto à capacidade de armazenamento, é legal, mas não vale a pena dar $200 adicionais nisso. Se você lotar seu kindle, sempre pode guardar seus arquivos no seu próprio HD.
Comparação de tamanho entre o Kindle e o Kindle DX
É verdade que com o Kindle a gente lê mais e gasta mais?
Sim. Sim. Desde o Kindle chegou, eu, que já não leio pouco, estou lendo exponencialmente mais. E também já comprei vários livros que não teria comprado se não fosse o Kindle. Como, por exemplo, abaixo:
* * *
Um caso exemplar:
Assinei a New Yorker pelo Kindle. Ela sai nas bancas na segunda, chega aqui em casa na quinta, mas já no domingo à noite eu estava lendo. Uma das resenhas era sobre uma nova tradução do The Canterbury Tales. Adorei a resenha e pensei: é verdade, estou pra ler esse livro há anos. Ali mesmo, sem me levantar da cadeira de balanço da minha varanda, eu entrei na Amazon, comprei a nova tradução da Oxford (por apenas $7), li a introdução e a história da Wife of Bath. Sim, por um lado, estimula o consumismo: comprei um livro que, normalmente, não compraria. Por outro lado, porra, que delícia. Ler a resenha, gostar, apertar um botão e já estar lendo o livro!
* * *
Veredito final:
O Kindle é perfeito para DUAS coisas:
1) Livros que você lê por prazer, em uma leitura lenta e contínua, página por página, com começo, meio e fim. O aparelho é gostoso de ler, de segurar, a bateria dura, tudo de bom. Como a maioria das pessoas lê assim, acho que o Kindle resolve o problema de quase todo mundo.
2) Livros para pesquisa, que você precise tanto buscar por termos específicos da sua pesquisa como fazer muitas anotações e citar longos trechos.
Só quem está no meio acadêmico sabe o tempo que se perde passando os olhos por todas as páginas de um livro sem índice onomástico para encontrar as menções à Fulano. Ou o tempo que se perde redigitando todos os longos trechos que você vai citar no seu trabalho, ou todas as longas notas, em letrinha miúda, que você escreveu nas margens.
Com o Kindle esse trabalho some. É mágico. A busca te permite encontrar rapidamente os termos que você quer, e tudo o que você sublinhou ou anotou está disponível num arquivo txt que você baixa no seu computador.
O Kindle NÃO é bom para:
1) Folhear.
Existe uma troca bem clara: você ganha a opção de buscar mas perde a de folhear. Passar rapidamente as páginas do livro é chato, lento e dá dor-de-cabeça. Ou você lê direto ou você busca: pular daqui pra lá e de lá pra cá é proibitivamente cansativo.
Um exemplo: The Canterbury Tales, citado acima, apesar de a compra do livro ter sido um excelente exemplo da conveniência do Kindle, também é um exemplo perfeito do tipo de livro que eu NÃO deveria ter comprado no Kindle. Porque não é nem um livro (como um romance) que vou ler sequencialmente do começo ao fim, e nem é um livro que vou usar numa tese: pelo contrário, seria um livro que eu gostaria de folhear longamente, olhar um pouco de cada história, decidir se agora quero ler a história do Knight ou do Friar, etc. Para isso, o Kindle é um saco.
* * *
A coisa mais irritante do Kindle: não dar pra criar pastas e subpastas pra organização dos livros. Sério. Depois de um certo número, fica muito chato de encontrar os livros lá dentro. Não pode ser tão difícil assim de criar!
* * *
Enfim, eu gostei, estou apaixonado, recomendo. Mais perguntas, deixem nos comentários e eu respondo aqui. E não, infelizmente não, esse não é um post patrocinado e não vou receber nem um centavo da Amazon. Se gostaram, se o texto foi útil, considerem comprar um dos meus livros. Ou comprem alguma coisa no Submarino entrando aqui pelo blog e eu ganho uns caraminguás. A casa agradece.
@cajuínas
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